MADE BY… FEITO POR BRASILEIROS

Passei parte da manhã de domingo visitando a área antes ocupada pelo Hospital Matarazzo, desativado há anos, e que nestes dias abriga uma imensa exposição. O local foi comprado por um grupo de investidores e vai se transformar, segundo dizem, em um hotel de luxo e um centro cultural. Antes de mais nada, é preciso que se diga: é uma vergonha que a colônia italiana tenha deixado falir um hospital. Outros grupos étnicos, dos tantos que encontraram em S. Paulo refúgio, trabalho e prosperidade, mantêm hospitais de excelência, como o Hospital Sírio Libanês, o Hospital Einstein (judeus), o Hospital Alemão Oswaldo Cruz, o Hospital Nipo-Brasileiro, a Beneficência Portuguesa e provavelmente estou esquecendo de algum outro.

Um dos corredores dos antigos quartos do hospital

Um dos corredores dos antigos quartos do hospital

Uma bela escadaria interna

Uma bela escadaria interna

 

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A fachada da maternidade.

Uma exposição enorme, com instalações de dezenas de artistas.

Com certeza, um evento que deve ser visto por todos que moram em S. Paulo ou passarem por aqui até o próximo dia 12 de outubro. A preparação adequação e montagem foi um projeto que durou três anos, coordenada pela Base 7, do Arnaldo Spindel, Maria Eugênia Saturni e Ricardo Ribenboim.

Dito isso, devo confessar que tenho uma relação de muitos conflitos com as artes plásticas contemporâneas. Sinceramente, meu lado racional tem enormes dificuldades para perceber o significado dessas obras, principalmente das chamadas instalações. Me parecem, muitas vezes, simples objetos decorativos, e não raro algo feito simplesmente “pour épater les bourgeois”. Ou, talvez, não queiram significar nada mesmo se não a incompreensibilidade do mundo, tal como vista pelo autor. Minha neta Laura, que estuda artes plásticas, diz que é por aí, que os artistas não querem dizer nada mesmo.  Apelo para o Bourdieu: se o campo das artes plásticas diz que é arte e valoriza isso, então é arte, e quem quiser que elabore sobre o assunto. Mas, também advirto, minha perplexidade é bem particular. Não sou crítico de artes, não domino esse campo. Compreendo muito bem que a apreciação de uma obra de artes plásticas exige uma compreensão mínima do contexto histórico em que este foi produzida, tanto da sociedade, quanto da própria história do campo artístico.

Eu só vejo, às vezes espantado, às vezes com um certo encanto pela imaginativa criatividade, e às vezes com a reação de simplesmente achar uma merda.

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Dora Kramer: incoerente e preconceituosa

A colunista do Estadão, Dora Kramer, habitual despejadora de bílis contra o PT e a candidatura Dilma Roussef, publicou no último dia 11, no Estadão, uma coluna com afirmações particularmente virulentas, acusando o PT de não aceitar o jogo democrático e “se apegar ao poder”.

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Sinceramente, fiquei injuriado. Com que moral vem essa senhora dizer que, para o PT, a alternância no poder não é “palatável”.

Pesquisei na Internet para ver se a senhora Dora Kramer teve atitude coerente com esse seu nojo em outras ocasiões. Particularmente quando o “trator” Sérgio Motta afirmou que o projeto tucano era “ficar vinte anos no poder”.

Como diz o ditado, não achei neca de pitibiribas. Sendo assim, enviei hoje um e-mail para a colunista.

kramerO texto completo do e-mail enviado está aqui:

 

Prezada Senhora

 Sou leitor atento e assíduo de sua coluna. Nem tanto pelo conteúdo, do qual quase sempre discordo, mas pelo fato da senhora escrever muito bem.

Na coluna do dia 11 de setembro último, no Estadão, a senhora escreveu um observação contra o PT que me deixou pasmo, pelo que revela de preconceito e incoerência.  Diz que “a alternância do poder não lhes parece palatável [ao PT]”.

Realmente é difícil entender de onde vem tal conclusão. Em primeiro lugar, porque nenhum – repito, nenhum – partido político cede voluntariamente o poder conquistado pelo voto. O PT já tem mais de trinta anos de existência, perdeu várias eleições para a presidência, ganhou três, até agora. Em vários estados e municípios, ganhou e perdeu eleições e entregou normalmente o cargo aos sucessores. Seria algo inédito no mundo – nunca na história mundial, poderia dizer o Lula – se o PT declarasse que estava satisfeito com três mandatos e que iria ceder o poder à oposição. Quem decide isso são os eleitores.

E, note-se, o PT jamais divulgou nem oficialmente nem por nenhum de seus filiados, algo como o que foi dito pelo falecido Ministro Sérgio Motta, e seu projeto de que o PSDB deveria ficar pelo menos vinte anos no poder. Procurei bastante, usando os mecanismos de busca da Internet, e não encontrei nenhuma referência a qualquer observação de sua parte a respeito do caráter profundamente autoritário dessa pretensão do falecido ministro. Que, aliás, se revelou um péssimo vidente. Pelo contrário, tudo que consegui achar a respeito do famoso Serjão, escrito pela senhora, são elogios à capacidade de articulação e de como ele conseguia manter o tucanato unido com sua capacidade de “tratorar” os adversários internos e externos.

A declaração do falecido ministro, aliás, se deu no contexto que se seguiu à aprovação da emenda da reeleição, quando recepcionou na sede do PSDB em Brasília um senador que se filiava ao partido.

Reeleição, aliás, conseguida com a compra de votos e com a truculência verbal e operacional não apenas do Sérgio Motta, como também da coorte parlamentar fernandista. Sérgio Motta deu a declaração no contexto de uma disputa com os antigos aliados dos tucanos no governo, o falecido PFL, cujos remanescentes se abrigam hoje no DEM, hoje a caminho da extinção.

E é bom recordar que o PT, em suas instâncias diretivas, recusou a apoiar o canto da sereia de alguns de seus militantes que pediam outra reforma constitucional, que possibilitasse o presidente Lula disputar mais um mandato. Emenda que poderia ser aprovada, certamente, sem apelos à sanha monetária de parlamentares, diante da imensa popularidade que ele dispunha naquele momento. O PT recusou os truques e prestigiditações para o tal terceiro mandato. Lançou candidata e ganhou mais uma vez as eleições

O que me fez recordar, falando de métodos para ganhar eleições, da ação da PF contra a candidatura da Roseana Sarney. Como diz o Mino Carta, até o reino mineral sabe que por detrás disso estava a candidatura do Serra à presidência, quando finalmente o Lula se elegeu presidente. O então senador-candidato manipulou e usou o aparato do Estado para alcançar seus propósitos partidários e particulares.

Infelizmente, senhora colunista, o sistema político brasileiro e suas imperfeições institucionais permitia esse tipo de ação. E a presença de gente de todos os partidos dentre os funcionários da PF até hoje permite os vazamentos selecionados de informações, principalmente às vésperas das eleições.

As respostas do PT às propostas da senhora Marina Silva decorrem das declarações que ela faz, das atitudes que toma, das vacilações que expressa. E que simplesmente abrem margem para que o PT, a candidata presidenta Dilma Roussef e demais militantes contraponham as propostas do partido à volubilidade de biruta de aeroporto da candidata que se diz bafejada pela Providência Divina.

Um pouco mais de coerência em suas opiniões, senhora colunista, só pode reforçar sua credibilidade.

Atenciosamente

Felipe Lindoso

 

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José Bessa em sua melhor forma no Taqui Pra Ti

Emocionante, o relato do Bessa introduzindo o texto de seu amigo Eduardo Nakamura, matemático, ambientalista e fotógrafo, sobre seu pai.

Taquiprati

 

MEU PAI É UMA FOTOGRAFIA
José Ribamar Bessa Freire
14/09/2014 – Diário do Amazonas
nakamura

Father – It’s not time to make a change/Just relax,take it easy/ You’re stil young.
Son – Now there’s a way and I know / that I have to go away / I know I have to go.
(Cat Stevens – Father & Son)

A relação pai x filho, tensa e amorosa, é tema recorrente da literatura, da psicologia e até do cancioneiro popular. Cat Stevens compôs Father & Son que reproduz diálogo do eterno conflito entre um jovem e seu pai e canta a ruptura do “cordão umbilical” dolorosa para ambos. A voz do cantor inglês, grave e controlada quando interpreta o pai, se transforma em aguda e vibrante quando quem canta é o filho. Tenho ainda hoje o disco de vinil Tea for the Tillerman quase perfurado de tanto rodar. Existe bela versão em português de Renato Teixeira com seu filho Chico.

Na literatura espanhola, há o conhecido poema de Jorge Manrique, uma elegia funerária escrita em 1476 quando seu pai Rodrigo morreu: Coplas por la muerte de su padre. Discorre sobre a vida, o sucesso, a riqueza e o descanso final, concluindo no canto XXXVIII com o pai agonizante, mas que aceita heroicamente o seu destino: “E consinto eu em morrer, com vontade prazerosa, clara e pura, que querer homem viver, quando Deus quer que morra, é loucura”.
Agora, em Manaus, Eduardo Freire Nakamura, que não pertence ao campo da literatura, escreve sobre a morte do pai. Ele é engenheiro, doutor em ciências da computação, professor das disciplinas Análise de Algoritmos e Cálculo Numérico na Universidade Federal do Amazonas (UFAM), além de pesquisador em vários projetos, entre os quais um na área de conservação e monitoramento ambiental, que usou sensores sem fio em armadilhas fotográficas destinadas a monitorar e catalogar espécies animais na floresta amazônica.
Eduardo compartilhou com seu pai George Nakamura, nipo-americano, a paixão pela fotografia. Exorcizou sua dor e seu amor, escrevendo. Nem sempre a qualidade literária de um texto corresponde à intensidade da nossa agonia ou do nosso afeto. Quando isso acontece, como é o caso, vale a penar compartilhá-lo. Só um amor tão profundo e o domínio acabado da palavra podem gerar uma escrita como a que vai abaixo.

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POLÍTICA DE INCLUSÃO DO MEC AUMENTA A PRESENÇA DE CEGOS NA GRADUAÇÃO

Todos sabemos – ou pelo menos ouvimos falar – das imensas dificuldades que os deficientes visuais têm que vencer para obter uma educação superior. Anos atrás, para os cegos era uma verdadeira façanha conseguir fazer uma universidade e se graduar. A própria D. Dorina Nowill é um desses grandes exemplos de determinação para conseguir alcançar e frequentar uma instituição de ensino superior.

daisy

Esta semana conversei longamente com Pedro Milliet, que é o principal responsável pelo desenvolvimento da informática da Fundação Dorina Nowill, dedicada à inclusão dos deficientes visuais, e que recentemente lançou um aplicativo para tablets da sua versão do programa Daisy, instrumento que permite aos cegos “ler” textos bastante complexos.

Logo escreverei um ou dois posts sobre vários pontos que Pedro Milliet apontou em nossa conversa, não apenas sobre o Daisy, como sobre o Acordo de Marrakesh, que complementa a Convenção de Berna sobre direitos autorais, no blog www.oxisdoproblema.com.br.

O Daisy, para os que não sabem, é um protocolo que transforma textos em voz e permite vários comandos dos usuários (marcar, situar o texto, copiar, comentar, etc.). Ou seja, não é apenas um “audiolivro”, e sim um complexo programa para uso dos cegos, disléxicos (eu não sabia disso) e mesmo de quem tem deficiência visual grave, mas não é totalmente cego.

Aqui quero apenas salientar uma informação que saiu na conversa.

O Pedro Milliet disse, no meio da conversa, que a política do MEC de exigir dos editores versões em Daisy dos livros didáticos do PNLD – Programa Nacional do Livro Didáticos (que atende ao ensino fundamental), e que foi estendido ao Ensino Médio, resultou em um aumento da graduação de cegos no ensino médio, e que estes estão entrando em maior número na educação superior.

– Vamos ter que lidar com as questões do livro universitário brevemente, e de modo sistemático – disse Milliet.

Claro, tudo culpa dos programas de inclusão dos deficientes aplicados pelos governos Lula e Dilma. Parte do programa do PT, sempre atento às questões de inclusão social – e não apenas econômica.

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O PIG MANIPULA NÚMEROS. E DISTORCE NA INTERPRETAÇÃO  DOS DADOS  

Na capa da edição impressa de hoje do ex-Estadão – hoje carinhosamente apelidado de Estadúnculo (e que meus inúmeros pecados sejam pagos pelo vício de continuar assinante, mas entre o dito cujo e a Falha é mesmo difícil), a manchete apregoa UM dos dados do Censo do MEC sobre o ensino universitário, a queda de 5,6% no número dos que concluem o ensino superior. E a matéria de capa prossegue dizendo que “os números também mostram que o ritmo de expansão do ensino superior diminui”.  E tascam os inevitáveis “especialistas”: “pode indicar dificuldades econômicas dos alunos para concluir o curso”. E emenda citando “outro estudo” que mostra que o Brasil gasta pouco em educação.

Capturar

É foda, como diria a madre superiora.

Para início de conversa, uma misturada básica de dados nessa última informação. O Censo do MEC está tratando especificamente de educação superior, no qual o gasto do Brasil é de  US 10.902 por aluno, contra uma média da OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – que é o estudo citado – aponta para US 13.958. Está abaixo da média? Sim. Os dados do dispêndio em educação em geral são ainda mais alarmantes, em termos de gastos brutos (totais). Mas… diz a OCDE que a média mundial de todo gasto público investido em educação foi de 13%, no Brasil foi de 19%, correspondente a 6,1% do nosso PIB. Evidentemente, nem menção ao objetivo do Plano Nacional de Educação de chegar a 10% do PIB investido em educação, coisa que não acontece da noite para o dia. Além disso, a manchete da OCDE informa que a mobilidade educacional começa a diminuir nos países industrializados. De qualquer maneira, eis aqui o link para a apresentação do estudo da OCDE – também convenientemente omitido na matéria do Estadúnculo.

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NECA DE PITIBIRIBAS E KÁTIA MISS MOTO-SERRA DE ABREU

José Bessa é meu grande amigo de mais de quarenta anos. Foi uma das primeiras pessoas para quem abri espaço aqui no Zagaia, e venho publicando seus artigos semanais com bastante regularidade. Além de grande conhecedor das questões indígenas – tanto da Amazônia quanto do Rio de Janeiro – o Bessa escreve de modo delicioso. Penso nele como uma espécie de Stanislaw Ponte-Preta revivido.

Geralmente concordo com quase tudo que ele escreve. Quase tudo.  Recebo o e-mail com o link no domingo e vou rapidamente até o site www.taquiprati.com.br. Esta semana não recebi. Mas fui lá ver.

E achei um post com o qual não concordo. Como não brigo com meus amigos por conta de política, e levo o Bessa muito a sério, parei para pensar e resolvi comentar o que ele escreveu.

Aqui está a foto do começo do post, que não reproduzo totalmente para este não ficar comprido demais. Mas vocês já sabem onde está. Vão até lá para ler:

taqui prati

Sim, meu amigo José Bessa, que foi fundador e presidente do PT no Amazonas, virou sonhático. E pergunta, no post, qual a razão pela qual “uma incerta esquerda” bombardeia uma das herdeiras do Itaú e, aceita como normal que a senadora Kátia Abreu – que o Bessa apelidou, ou pelo menos divulgou, com o delicioso apelido de Miss Moto-Serra – esteja do lado da Dilma. E desafia os argumentos da certa direita e da incerta esquerda.

E termina o post assim: “Nenhum eleitor encontrará um candidato que atenda integralmente suas expectativas. De qualquer forma, será um privilégio o Brasil poder decidir entre candidatas como Dilma e Marina, duas ex-ministras de Lula, igualmente dignas, corretas e limpas, submetidas às alianças e mediações do poder. Embate entre Kátia Abreu e Alice Setúbal? Necas de pitibiribas.”

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Uma historinha exemplar

Alfredo Nascimento é um político nascido no Rio Grande do Norte e imigrado para o Amazonas, onde estudou e se formou em Letras e Matemática. Próximo de um conhecido político amazonense, Amazonino Mendes, foi por ele nomeado interventor na Prefeitura da Capital, depois se elegeu prefeito da cidade e, dois anos depois, vice-governador na chapa do Amazonino Mendes. Em 2006, elegeu-se Senador pelo Amazonas. Nestas eleições concorre a um mandato de Deputado Federal.

A vida política de Alfredo Nascimento é recheada de denúncias, mudanças de partidos e alianças variadas. Nisso, o parlamentar não difere de tantos outros.

Em seu mandato para o Senado, por exemplo, elegeu-se pelo PR, mas seu suplente foi João Pedro, do PT. Seu mandato terminará em janeiro de 2015. Só para lembrar, o PR era a agremiação do falecido Vice-Presidente do Lula, José Alencar. Atualmente, ele é presidente do PR.

Não o conheço pessoalmente, mas quem o conhece diz que é pessoa simpática, muito envolvente.

Em 2010, saiu do Ministério dos Transportes para se candidatar ao governo do Amazonas (foi derrotado), e é esse o eixo da historinha que quero contar.

Enquanto esteve no ministério, Alfredo Nascimento tentou sempre conseguir meios para reconstruir a Estrada Porto-Velho Manaus.

Essa estrada é uma aberração. Corre paralela ao Rio Madeira, que é o escoadouro natural para a produção do norte de Rondônia e do Acre, além de ser uma das regiões mais importantes do Amazonas.

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MOCK PIRARUCU – CULINÁRIA ENGANOSA

Meu irmão Pedro Lucas, que mora em Manaus, publica crônicas no Jornal do Commercio. A que transcrevo, publicada hoje, é dedicada também à nossa sobrinha, Carolina Lindoso, que recém se diplomou como Chef no curso do Cordon Bleu, em Portland, EUA.

Eu achei a experiência que ele relata muito perigosa. Mas divertida.

Vejam só:

MOCK PIRARUCU – CULINÁRIA ENGANOSA

Meu amigo Duda Ferreira nasceu em Manacapuru, bem antes da inauguração da Ponte Rio Negro e ganhou o mundo. Formado em engenharia no Rio de Janeiro, fez pós-graduação em conceituada universidade americana. O seu hobby é “culinária”. Com a vida estabilizada e divorciado, resolveu tirar férias em Las Vegas e fazer um “workshop” de cinco dias no Le Cordon Bleu da cidade do pecado. Gostou da experiência. Como bom amazonense quis preparar um prato amazônico. Impossibilitado de conseguir os ingredientes, ficou entusiasmado com a sugestão de um chef inglês: “mock turtle soup”. Sopa de tartaruga! Segundo o chef inglês a verdadeira sopa de tartarugas era de difícil acesso porque as tartarugas marinhas são espécies protegidas na maioria dos países ex-colônias. Como os britânicos gostavam muito de sopa da tartaruga, decidiram inventar uma sopa que substituísse a original e chamaram-lhe “mock turtle soup”. A palavra “mock” em Inglês significa falso, simulado. E assim é a tal sopa, confeccionada com cabeça de vitela, presunto, cebola, cogumelos, aipo e manteiga. A experiência serviu para Chef Duda exercitar sua criatividade culinária, no que ele, jocosamente, chama de ”culinária enganosa”. Eu já conhecia a propaganda enganosa, mas culinária é novidade para mim. Duda se diverte com isso. Uma de suas especialidades é fazer uma torta de camarão de mentira, cujos ingredientes básicos são palmito, leite de coco e ketchup. Fica mesmo com certo gosto de camarão! Mia Couto, escritor de Moçambique disse que: ”Cozinhar é o mais privado e arriscado ato. No alimento se coloca ternura ou ódio. Na panela se verte tempero ou veneno. Cozinhar não é serviço. É um modo de amar o outro.” Pois bem, Duda esteve nos visitando em Manaus e foi a Manacapuru. Estava encantado com a ponte e o acesso fácil à sua cidade. Na feira viu uma manta de pirarucu. Foi avisado que não era bem o tal legítimo bacalhau da Amazônia. Comprou assim mesmo. E resolveu nos convidar para comer um tal “Mock Pirarucu”. Modéstia a parte, meu Inglês é bom o bastante para saber que “mock” significa falso, de mentira, enganoso. E perguntei logo se aquilo era mapará. O mapará é um peixe abundante na Amazônia cujo sabor assemelha-se ao da pescada branca. É um peixe muito versátil e combina com diversos preparos. E mais, o seu custo é relativamente baixo. Para nossa surpresa tratava-se de carne de  jacaré. Mas dizem que ficou gostoso. Cuidado quando Duda Ferreira convidar para jantar. Eu que não me arrisco a comer gato por lebre.

 

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O TEATRO E A ARENA

Meu irmão Pedro Lucas, que mora em Manaus, publicou a crônica abaixo no Jornal do Comércio, que reproduzo.

Informo também aos agourentos que já existem três empresas internacionais interessadas em administrar a Arena Amazônia. Que, tal como o Festival de Ópera do Amazonas (que é feito no Teatro e em ruas e praças de Manaus), poderá atrair milhares de pessoas para jogos do Brasileirão (perguntem quantos torcedores dos clubes cariocas existem em Manaus?), e como espetáculos. É ARENA, e não somente estádio.

Mas, vamos ler, leiam a crônica do Pedro:

Do alto de seus cento e dezoito anos de idade o majestoso Teatro Amazonas contempla a sua amada e suntuosa Arena da Amazônia. Enamorado do novo ícone, rival em beleza e importância para os manauaras, a famosa Casa de Óperas declara-se para o recém-inaugurado postal da cidade:

Assim como eu, você foi criticada durante toda a construção. Muitos foram contra. Não nos queriam em pé. Alguns a favor. E naturalmente, todos se beneficiaram. Eu sou do ciclo da borracha. Você é do ciclo Zona Franca. Na minha época, como agora, Manaus se apresentava ao mundo como um centro urbano cosmopolita. Foi criada uma universidade, que dizem seria hoje a federal do Amazonas. Há controvérsias. Nesses novos tempos criou-se também mais uma: a universidade do Estado do Amazonas. Nem tudo está perdido. Mas, querida arena, você está nos seus dias de glória. Todavia, não se engane. Você não será somente palco de jogos internacionais. Como eu não fui só de óperas italianas e memoráveis espetáculos teatrais. Não. Servi também para sórdidos espetáculos de vaudeville, comédias de baixo calão, regabofes, banquetes inconfessáveis, e pasmem! Depósito de borracha in natura! E você querida arena, vai receber o papai Noel de helicóptero, vai ser palco do peladão e muito show tão contestável como alguns espetáculos de atores canastrões que por aqui passaram. E claro, como eu, você será desvirtuada, vilipendiada, reformada, restaurada, usada e abusada. Eu fui concebido nos tempos em que os republicanos precisavam mostrar força e pujança. Não é a toa que minha cúpula é verde e amarela. Viva a República, minha querida. Agora você é o suprassumo da era dos ecologistas e da sustentabilidade. Com seu jeitinho charmoso de cesto com motivo tribal, você ficou linda! Reflete totalmente, a nossa identidade. Assim como eu, você foi projetada longe daqui da floresta. Claro, seu projeto atendeu exigências ambientais. A água da chuva é armazenada e a luz solar, abundante por aqui, gera energia limpa e renovável. O uso de tais tecnologias foram concebidas por uma empresa da Alemanha que andou fazendo outras arenas pelo país, segundo me informaram. Já o meu projeto arquitetônico foi feito pelo Gabinete de Engenharia e Arquitetura de Lisboa e me orgulho muito da minha decoração interna, sob a responsabilidade de Crispim do Amaral e claro o meu luxuoso Salão Nobre entregue ao famoso artista italiano Domenico de Angelis. Não ligue para essa ponte sobre o rio Negro, que se diz também cartão postal. Nós somos do espetáculo, da diversão, da alegria, do fausto, da festa e do riso. A ponte só leva e trás. Ah! Vou te contar um segredo: Caruso jamais cantou no meu palco. Isso é lenda. Mas não conte para ninguém. Você também terá seus mitos e mistérios. Mas de uma coisa ninguém poderá negar. Apesar do fiasco português, o atacante Cristiano Ronaldo, tido como o melhor do mundo, jogou no seu gramado durante a maior copa que o Brasil já viu. Que o povo de Manaus nos conserve e nos use com dignidade, sempre. Um beijo amazônico para você, querida ARENA DA AMAZÔNIA!”

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COMIDA

“A gente não quer só comida
A gente quer comida
Diversão e arte” – Titãs

 

Até que andei emagrecendo recentemente (as famosas recomendações médicas), mas adoro comer. E cozinhar – aos domingos, e só aos domingos.

É o momento clássico de congregação familiar. Claro que não obrigamos os filhos a vir (e, como a Galiana mora no Rio, seria difícil…), mas o José Gabriel, com a Sabrina e os netos geralmente vêm, e é uma curtição.

Hoje, como estão viajando, cozinho só para minha namorada de sempre, Maria José. Algo simplesinho: picanha de cordeiro e uma massa com pesto; sobremesa, sorvete e goiabada com requeijão.

Picanha de cordeiro e massa com pesto

Picanha de cordeiro e massa com pesto

Mas gosto de preparar a comida amazonense, e com receitas tradicionais, as que aprendi vendo como se fazia na casa de meus pais, em Manaus: pirarucu fresco, empanado, guisado, com ou sem leite de coco; caldeiradas, de tambaqui, tucunaré; pirarucu seco, o “pirarucu do céu”. Esses ingredientes são relativamente fáceis de conseguir. Aqui, já importam pirarucu e tambaqui congelados, se bem que, na verdade, o tambaqui que chega, de criadouro, nem de perto alcança o tamanho dos que se encontram nos mercados amazonenses, é só o que chamamos de “um ruelo”, e a famosa costela é ridiculamente pequena. Mas quebra o galho da saudade. O pirarucu seco de vez em quando consigo, mandado pelas minhas irmãs que ainda moram em Manaus (e que levam para Brasília, onde mora minha mãe, e de lá é devidamente socializado). Farinha, principalmente a seca do Uarini, também só devidamente contrabandeada na mala de alguém. Dona América, mãe do Márcio Souza, sempre se lembra de colocar um ou dois pacotes na mala dele quando ele vem para S. Paulo… Pimenta murupi, a rainha absoluta das pimentas, pois é cheirosa e picante ao mesmo tempo, só assim também.

Pimenta Murupi, a Rainha das Pimentas

Pimenta Murupi, a Rainha das Pimentas

Mais difíceis são os outros peixes. Um jaraqui frito, uma sardinha (de água doce) na brasa e outros mais, só na memória. Pato no tucupi e tacacá, dificílimo, pela falta do tucupi e do jambu. Dizem a Nina Horta e a Neide Rigo que encontram jambu por aqui. Nunca achei.

Não gosto – até por falta de experiência, reconheço – dessas “recriações” feitas com os ingredientes. A memória pede a tradição. Mas não me importa que gente por aí ande recriando os sabores amazônicos.

Já brinquei muito com o Carlos Lazarini, meu cunhado e pesquisador da Embrapa, protestando pela pesquisa não ter estabilizado ainda a semente do murupi. Explico: como todas as capsicum, a semente do murupi é muito instável, e as mutações ora produzem uma pimenta sem cheiro, mas ardida, ora o inverso, cheirosa que não arde, ou uma que parece um pimentão, que nem arde nem cheira. Garanto a vocês: um molho de pimenta que conseguisse preservar o ardor e o cheiro da murupi desbancaria qualquer outro molho do planeta. E a Embrapa já fez isso com o pimentão, outro capsicum: quem planta sabe que pimentão vai sair: verde, amarelo ou vermelho.

Fica, mais uma vez, o protesto e o apelo: Embrapa da Amazônia, por favor estabilizem a semente da pimenta murupi, para a delícia do mundo.

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